Conversas com estudantes sempre me estimulam a estudar mais e a me questionar.
E como atualmente também trabalho como preceptora dos acadêmicos da UFRJ, para mim, esta é uma oportunidade de ver grandes profissionais nascendo.
Então esses dias fiquei muito feliz e, ao mesmo tempo preocupada, com a posição de uma acadêmica de medicina.
Ela me dizia que pensava seriamente em ser Obstetra, porém também me contava do tipo de parto que aprendeu a considerar “normal”.
E mesmo assim, ela gostaria de ter um bebê por via vaginal.
É lindo uma mulher desejar que seu filho venha ao mundo de maneira natural. Acho que esse desejo, quando genuíno, revela a voz da biologia, da natureza num diálogo direto. É como se o espírito desse bebê já estivesse em contato com esta mãe, pedindo um nascimento em paz. Muitos diriam que é uma viagem espiritualista, mas outros compreendem do que estou falando.
Fui comovida por aquele desejo, mas também me preocupei com o que ela compreende como parto, já que sua amostra de partos é medicalizadamente viciada.
E fiquei me perguntando como alguém pode querer passar pela experiência de parto, quando o que conhece é o doloroso, o solitário, o coisificado, o ruim.
Imagina quando ela souber o quanto o parto pode ser extasiante?!
Se conhecendo partos tradicionais, ela já se interessou, se tiver a chance de conhecer a obstetrícia baseada em evidência, vai se apaixonar perdidamente. Creio eu.
Mas será que a imersão no sistema obstétrico atual permite que um profissional de boa vontade siga outro caminho senão o imposto e limitado?
Todos os poucos obstetras humanistas que conheço traçaram um caminho bem difícil, porém consciente e sem volta. É um caminho tão diferente que poucos puderam percorrer de verdade até o fim. E mesmo depois que se encontram como profissionais, as criticas não cessam, marcando um paradoxo - científico e moral - imperdoável entre as críticas aos humanistas – que fazem certo - e exaltação dos cesaristas desenfreados – que não fazem o certo.
Não é atrás apenas do termo “Eu FIZ o parto de alguém” que se esconde toda a distorção feita contra as mulheres diante de seus partos. Cada vez que dizemos que seu parto é imprevisível e perigoso demais para ela ser completamente autônoma neste processo, matamos um pouco a esperança de um mundo melhor. Toda vez que dizemos a uma grávida que ela deve parir num hospital, tiramos dela a chance de colocar seu filho no mundo, e com isso prejudicamos o futuro da humanidade.
Loucura?
Um parto não é só um parto. Um nascimento não é só um nascimento. Cada espírito que nasce precisa ser bem recebido e se não formarmos profissionais que acreditem visceralmente nodireito primal feminino de parir sua cria, que cenário mundial vamos mudar?
Se esta acadêmica e seus colegas não conseguirem enxergar logo além dos bisturis, estaremos os condenando ao simplismo e passividade e as nossas mulheres e bebês a partos medicalizados.
Porque depois de um tempo, “os peixes não conseguem mais ver a água” e este "parto" vai continuar sendo doloroso, temido e repugnante.
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