A Obstetrícia Humanista

- O parto Natural e humanizado de verdade - A maneira segura e emocionante de ajudar mulheres trazer crianças ao mundo

terça-feira, 1 de outubro de 2013

O Que Eu Não Faço

Quanto tempo!

Resolvi voltar a escrever aqui depois de umas cobranças  muito carinhosas que tive recentemente!

Então... Semana passada recebi de uma mulher um e-mail - que espero que tenha sido brincadeira - me implorando pra assistir em casa o parto onde sua empregada dela daria lhe o bebê, porque ninguem poderia saber.

O e-mail era muito comovente. Falava do desespero da mulher em ser mãe e não poder e agora queria agarrar com todas as forças essa oportunidade.

Eu nem me dei o trabalho de responder tamanho é o absurdo.

Meu trabalho não é criar situações inseguras, ilegais, mesmo diante desse tipo de desespero.

De coração eu entendo o que essa mulher pode estar sentindo, mas envolver outras pessoas numa situação tão delicada e perigosa assim chega a ser desrespeitoso. Foi assim que me senti. Desrespeitada. como se eu em alguma dimensão fosse capaz de aceitar dinheiro pra esconder uma coisa tão séria e que pode dar tanto problema para todos. Enfim, fadada ao fracasso.

Outra coisa é o aborto. De vez em quando vem uma me perguntar como se faz pra "tirar o filho". Eu não ensino, não faço e não indico quem faz. Pede pra alguem que apoia a descriminalização fazer. Eu entendo, não condeno e nem vou considerar isso em qualquer tipo de relação que venha a ter. Tenho amigas e parentes que ja fizeram e eu posso dizer de coração que eu compreendo. Mas acho um absurdo envolver terceiros numa questão ilegal, que pode dar cadeia e um baita peso na consciência. Eu trabalho com nascimento, com planejamento familiar, posso orientar uma mulher a como proceder na adoção, mas nada que direta ou indiretamente agrida o meu direito pessoal de estar em paz com minha consciência.

E tambem não aplico esteróides anabolizantes, nem facilito acesso a medicamentos psicotrópicos. Porque acho que a beleza fisíca e a paz mental são frutos de esforço e auto vigilância. Isso não vende na farmácia.

Assim como o parto, que é um processo. Por isso não chamo cesarea de parto, principalmente se for eletiva sem indicação. Não compactuo mesmo com um centro cirurgico que entrega/produz um bebe/h pro berçário, lembrando que abomino berçário. O bebê é da mãe. Mesmo cansada.

Então...
Me peça várias coisas. Já sou muito mais corajosa e científica pra parto que a sociedade quase inteira. Mas não me peça pra me trair.
Porque eu não vou.



segunda-feira, 2 de abril de 2012

Um Insulto Sob Medida...


Eu e muitas outras ativistas, chegamos a um patamar "obstétrico", onde não é mais possivel nos expor a obstetrícia tradicional. Ninguem vai me tocar, me cortar, nem me violar nas partes mais intimas e sagradas do meu corpo... A menos que eu esteja sedada ou morta.
Minha luta nao é mais por mim. Nem mesmo é pelas mulheres da minha familia, pois todas sabem como as coisas são e elas que decidam por si. Nao estou aqui para salvar ninguem. No máximo, estou para ajudar quem quer mudar seu destino. Mas o caminho a percorrer é árduo e intransferível.
Minha luta particular é pela humanidade como um todo. Em vários sentidos. E no nível micro, me policiar para cada vez mais deixar o parto acontecer sem meter meu mãozão no meio.
Hoje ja nao me ofendo pessoalmente quando uma mulher diz que quer parir e termina numa cesarea salvadora. Como Francisco de Assis, peço para compreender mais do que ser compreendida....
Mas no último mês, a obstetrícia me feriu como NUNCA antes.
Um fato em especial, machucou meu coração, como eu nao imaginava que poderia...
Um amigo de infância aguardava seu primeiro filho feliz e ansioso, após ja ter perdido um bebê 2 anos antes, já quase a termo. Encontrei com ele na praia onde crescemos, quando a esposa estava em trabalho de parto, já no hospital. Ele mora numa ilha, então veio antes por lá nao ter "recursos". Desejei-lhes uma boa hora, mesmo sabendo que ele é homem, e parti.
Na semana seguinte, quando o encontrei, ele estava empolgado, mostrando a foto pouco nítida de seu menino tirada do celular. Linda criança, de fato. Nao pude deixar de perguntar... Maldita intimidade.
- Foi normal?
- Foi.......................................................
Pra que fui perguntar...
- Estragaram minha mulher, Di...
Ai...
- Ela ta morrendo de dor, se perguntando se a vai voltar ao normal... Ficou muito feio, tadinha... Cortaram ela toda por baixo... Pra todo lado.... Precisa mesmo disso?....
Enquanto eu via os olhos daquele brutamontes com quem cresci - e que sabe de verdade quem sou - se inundarem de lágrimas, me envergonhei por fazer parte dessa mesma obstetricia nojenta... Que não apenas machuca, mas fere profundamente, estupra e tira a dignidade das nossas mulheres... E eu nada posso fazer.
-Não... Não precisa cortar pra todo lado, nao, meu amigo.
O que mais eu poderia dizer, se eu senti toda sua dor?
Ali eu não precisava ser ética. Estava em família. Comecei a dizer que ele poderia processar e que aquilo não podia ficar assim... E apesar dele concordar, vi que tinha que tomar muito cuidado para não feri-lo ainda mais.
De um parto, esse casal terá que RECONSTRUIR sua vida sexual, provavelmente com muita dor, estranheza e até vergonha. Não pude deixar de me colocar no lugar dela, porque parecia que a violentada era eu.
Ao enxugar as lagrimas, ele dizia "Levo mais fé numa parteira do que nesses caras"... Mesmo com todo o preconceito enraizado, ele sabia que devia existir alguma alternativa menos humilhante do que a que sua esposa, seu amor, fora submetida.
Logo nos recuperamos do peso dessa realidade, falando sobre a amamentação, o orgulho do filho e meu assunto igualmente preferido: trilhas. Na verdade, eu fiz um esforço pessoal pra sair daquele assunto, porque naquele momento eu vi o quão importente eu sou. O quanto nossas palavras e dedicação sao limitadas.
Quase todas as minhas amigas fizeram cesareas com maquinha fina ou "sofreram" partos vaginais excruciantes.
Não pude deixar de pensar o quão refem nós somos desses dois modelos mediocres... Ou uma cesarea limpinha ou um parto Anormal. Claro que tem que existir algo por detras do arco íris...
Quando falo de parto gostoso, sem dor, libertador e ate orgásmico, essas mulheres me olham como uma louca que fumou maconha demais, ainda que eu seja contra qualquer droga. Nunca deixarei de esbravejar sobre as diferenças, mas, cara, eu nao vou mudar o mundo. Nem a obstetrícia.
Mas juro que não quero jamais ter que escutar alguem descrever aquelas violações de direitos humanos com tanta riqueza de detalhes nem olhar aqueles olhos - que conheço tão bem - se avermelharem até transbordar.
Não... Se existe um Deus, peço que não me faça mais passar por isto.
Ele estava ansioso pra ir embora o quanto antes pro seu paraíso pessoal e esquecer a dilaceração física e a humilhação pessoal que destruiu um bom pedaço do seu coração.
E eu....
Eu fiquei aqui... Tentando entender... Tentando contabilizar quantos anos e quantas mulheres terão que ser machucadas até que nossa realidade se transforme.


sábado, 27 de agosto de 2011

"Brigar" pelo Parto



Me incomoda de certa forma, ver as mulheres brigando por seus partos.
Pq a gente so briga pelo que nao tem, pelo que nao esta facil. E quando brigamos, nos colocamos contra alguma coisa.

Sei que mtas mulheres aqui tiveram literalmente que brigar por seus partos. Algumas conseguiram, outras nao.

Outras nao brigaram, simplesmente se entregam às maos do seu medico "pq ele sabe o que é melhor e eu nao tinha opçao, pq meu plano nao cobre profissional humanizado". E ate mesmo alghumas dessas conseguiram parir.

As duas formas acima de sonhar ou planejar partos tem suas falhas e seus sucessos, mas nao sao garantias de um parto legal.

Porem, todas as mulheres que EU acompanhei o TP e pararam de brigar, sem se entregar aos deuses medicos, conseguiram.

Nao sei se consigo ser clara, mas nao é uma postura ativa de negaçao ("Nao vou ter cesarea e ponto final!) nem de "seja o que deus quiser" que trazem o parto que queremos. 
Somente a sutileza do obvio pode trazer.

Vou citar duas pessoas que acompanhei da lista e que nao se importam que eu comente. Uma foi a Antonieta, recentemente. Enquanto ela estava "brigando" por seu parto, seu parto nao lhe estava acessivel. Mas qd duas pessoas na qual ela confiou (nao cega, mas racionalmente) lhe disseram o que honestamente achavam, ela concordou pq no fundo acho que sempre soube como poderia ser e, entao, de fato, confiou.
Traduzindo, foi naquele momento que ela parou de brigar e se entregou ao que de melhor poderia acontecer de forma segura naquele momento.
Seu parto foi como sua busca pelo seu parto. Demorou a pegar e precisou de intervençao de outras pessoas, tanto para encontrar suas parteiras, quanto para iniciiar seu TP. Mas qd começou mesmo, nao deu tempo de nada. Surpreendeu positivamente a todos. E nos deu uma alegria particular nesta lista. Foi uma historia de muito sucesso onde ela com o marido mais maduros e os profissionais, na hora certa fizeram a diferença. Talvez nem antes nem depois tivesse o mesmo desfecho, mas o universo conspira a favor.

E a outra... 
Todo mundo conhece a Renata, ela dispensa comentarios, mesmo assim vou comentar!
Todos dizem que pra Renata foi facil. A Renata é mto mais do que confiante... Ela é espontanea. Se nao fosse tao esperta, eu diria que é ingenua. Nao ve disficuldade onde geralmente vemos, ve o que quer ver e faz acontecer. Deve ter a ver com a criatividade, sei la. Mas ela nunca brigou tanto quanto nunca duvidou.
Talvez para ela, nao tenha realmente sido dificil parir, mas seu merito nao esta em mentalizar 18 meses seus 2 partos, o merito esta na construçao da pessoa que é. E mudar tudo é mto mais dificil do que mudar so para parir. Mas ainda sim, A Renata ja veio assim. Nossos pensamentos sao bem parecidos, mas eu tive que me construir nesta vida, e nesta, ela ja veio assim... Meio que totalmente pronta rs.

Algumas nao concordarão. Acredito que isso aconteça por nao compreender o que realmente estou dizendo. Mas antes dessa conclusao, quero que saibam que nao estou falando da mulher que nao esta nem ai pro seu parto pq sabe que vai enganar seu medico e chegar parindo, jamais diria isso e isso nunca deu certo.

Estou simplesmente dizendo que existe um padrao e nao coisas inexplicaveis desconectadas e misteriosas para conseguir ou nao. 
Ha poucas coisas das quais estou certa, mas esta é uma das que acredito que realmente esteja conseguindo uma conclusao logica.
Eu preciso disso para trabalhar.

Fim das minhas teorias por hoje!

terça-feira, 30 de novembro de 2010

A Parteira


Sempre no meio da humanização, conheci todo tipo de parteiro urbano, mas muito poucos encontros com parteiras tradicionais e todo o glamour e misticismo que as acompanha.

Desta vez, fui sabendo que ela estaria lá. A parteira que não gosta de ser chamada de índia, tinha 81 anos e uma saúde tratada à chá de mato e muito movimento.

Ela era jovem, bonita e tinha uma coisa muito feminina e maternal que vi em duas ou três mulheres em toda minha vida. O tipo de mulher que me faz querer deitar no colo pra me sentir segura como nem posso descrever.

Fantante, me contava de como sua mãe morreu, fugindo dos homens que a queria prender numa casa, tendo sido encontrada mais tarde abraçada a flores, totalmente conectada à terra e à Terra.

Sobre os partos, me deu todos os detalhes. Nossa dificuldade de compreensão da linguagem da outra foi superada. Enquanto alisava a toalha de mesa, me contava suas historias, suas fomentações, suas rezas, sua fé inabalável, seus segredos e sua incompreensão inocente sobre o modo como vivemos.

Levei vídeo de um parto hospitalar e de uma cesariana para saber in natura a impressão que esses dois eventos causam a alguém tão ligado a natureza, como parte dela. E supreendeu minhas expectativas.

Seu rosto marcado mostrava a dor em ver aquelas cenas genuinamente agressivas, mas já tão naturais para nós. E neste momento fez todo sentido que as mulheres morressem de medo de parto, as cenas eram de fato assustadoras. Gritos, movimentos bruscos, posições anti-naturais, ordens, cortes, injeções... Assim tem que doer.

Ela murmurava chocada “Coitadinha da mulher... Olha o neném, não pode fazer isso... Que dor que ela ta sentindo... Não é desse jeito que pega o menino”...
E depois assistiu meus partos na água e na cama tranqüilamente....

Ela dizia que meu trabalho em divulgar isto era muito importante, pois as mulheres não imaginavam um parto assim ou como seria uma cesariana. Ela tomou um susto quando eu disse que muitas sabiam como era e mesmo assim escolhiam a cirurgia. Quem, alem delas, pode realmente entender?...

Quando perguntei o que ela fazia quando um parto demorava eu tive a mais simples das respostas...:

- Capaz que parto demora!
- A senhora nunca passou uma noite inteira ao lado de uma mulher em trabalho de parto?
- Capaz uma noite inteira! Depois do parto é que demora que a gente vai cuidar do bebê, fazer uma canja, ajeitar a casa...”
Que tapa de luva na minha cara orgulhosa pelos longos partos assistidos!...
- E como a senhora faz com a dor?
- Teve uma vez que uma sentiu dor e disse que ia morrer. Aí eu contei uma piada, ela riu e o neném saiu!”

Em, sei lá, 40 anos aparando bebes, ela não conheceu a morte de nenhuma criança ou mãe, não conheceu a dor do parto, não conheceu um parto demorado, muito menos ocitocina, episiotomia, misoprostol, gestação prolongada, aminiorrexe prematura, ruptura uterina, maformação, mecônio espesso, UTI neonatal nem cesariana. Que currículo!

E há alguns anos para azar de todos, foi quase oficialmente proibida de partejar, porque a tecnologia hospitalar chegou à cidade e com poucos partos por mês, não justificaria uma maternidade se ela continuasse. Sem comentários.

Anotei as receitas de como fazer uma mulher parir sem demora e sem dor. Voltei de lá apaixonada e com a promessa de retornar e com um trato (quase ameaça) fechado: se eu engravidar de novo, vou para lá e se ela não “fizer” meu parto, eu ganho sozinha. Seduzida ela respondeu com olhos brilhantes que sim...

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

A Gestação e o Parto de um Homem

Foi neta pedra em Itatiaia que escolhemos saber que a Gaia já estava morava em mim

Por Sandro Domingues. O meu segundo parto contado pelo meu marido.

Ela disse: “Está atrasada”.
E eu, deitado de costas para ela, coloquei levemente a mão sobre seu ventre, senti claramente e pensei: “Caramba! Está aqui!”.

A confirmação (nem precisava) foi lida alguns dias depois naqueles dois risquinhos vermelhos do teste mergulhado no potinho de xixi. Estávamos nós três (Eu, DyDy e Klaus) e mais ninguém, acompanhados pela natureza exuberante da Mata Atlântica. Sentados à nossa “Pedra Sagrada”, colocada pela divindade às margens daquele rio transparente como o ventre daquela mãe, pois aquele bebê estava tão visível para mim quanto o fundo daquele curso d´água.

Ninguém mais sabia, ninguém mais soube, por algum tempo. Guardamos nosso segredinho para ser curtido sem interferências, relembrado a cada minuto daqueles deliciosos dias. Imprimindo em nossos rostos o enigmático sorriso bobo que ninguém conseguia decifrar.

O tempo passando, a barriga crescendo e eu conversando com aquela criaturinha por aquele microfone em formato de umbigo. Assistíamos o constante deslizar de seus membros elevando graciosas ondulações abdominais. A barriga daquela mamãe transformava-se em um imenso relevo Braille que não cansávamos de ler com as mãos.

Saber o sexo? Na, ne, ni, na, Não! Só quando nascer. A família morrendo de curiosidade, mas a certeza só na hora do parto. Sentíamos claramente a energia feminina daquele bebezinho, mas jamais estragaríamos a surpresa conhecendo o presente antes de abrir o embrulho. Na escolha do nome nem pensamos em masculinos e foi por Aglaia que decidimos. Ela seria tão bela e gloriosa quanto o significado de sua graça.

Certo dia, eu, deitado sem peso por cima daquele barrigão, percebendo o momento, disse para a mulher que estava por baixo do barrigão: “Do jeito que eu fiz, eu vou tirar”. E começamos a “namorar” (entre aspas mesmo), calma e tranqüilamente. Se usei a energia sexual para colocar aquele bebê lá dentro, então a usaria para tirá-lo de lá. Eu jamais deixaria outra pessoa terminar na maca o que eu comecei na cama. Se eu soube colocar o bebê lá entro, eu tenho que saber tirar. Não poderia permitir que ela saísse do ninho para ser cortada em um hospital, cercada de homens vestidos de astronauta, munidos com seus instrumentos cortantes, inoculando suas químicas industriais. Como poderia expor a um refletor aqueles olhinhos que nunca viram a luz? Tais artifícios podem ajudar, mas o abuso tornou-se rotina e trouxe danos.

Absurdos à parte (daria um livro), retomo o assunto. Ao terminarmos, iniciaram-se leves contrações. Era de tardinha, tiramos um cochilo e depois fomos caminhar. Voltamos para a casa e mais à noite fomos passear na pracinha da cidade. Contando os intervalos das contrações, a bolsa rompeu-se (21h50) e corremos para a casa. Às 23h30 a enfermeira (obstetra) chegou, pois eu não estava preparado para dar pontos caso houvesse laceração (risos), mas não foi preciso.

Em meio a gemidos e contorções Dielly exclama: “Não agüento mais, tem que nascer até meia noite”. Ao que respondi: “Agora deixe comigo”. Esfreguei as mãos e imaginando uma luz dourada entre as mesmas, aproximei-as das costas daquela mãe ansiosa, fazendo aquele foco brilhante de energia penetrar-lhe o corpo. Imediatamente ela exclamou assustada: “Entrou uma coisa aqui, tem uma coisa aqui dentro”. Algo que ela em seguida definiu com a frase: “É uma Vontade de Nascer”.

A partir de então, eu tinha muito mais certeza de tudo o que ocorria no corpo dela e do momento certo em que as coisas aconteceriam. Logo coloquei as mãos sobre sua barriga e sem tocá-la trouxe a cabeça do bebê até a portinha de saída. Ela coroou. Não adiantava insistir, eu sabia que era hora de descansar. Paramos para relaxar e, alguns minutos depois, coloquei novamente as mãos enviando-lhe mais daquilo que eu sabia fazer de melhor naquele momento. Novamente, sem tocar, comecei a trazer o bebezinho para o lado de fora. 23h57m. Três circulares de cordão, sem problemas. Uma no pescoço, uma na cintura e outra na perna.

Do ventre para minhas mãos e delas para o seio. Prontamente a enfermeira ligou o aquecedor para deixar tudo mais agradável ao bebê. Olhávamos pela primeira vez seu rostinho, piscando vagarosamente os olhinhos, deitada sobre o seio, estabilizando sua respiração, quando delicadamente a enfermeira deu-me a tesoura para cortar o cordão. Segurei-o pedindo permissão às duas para separá-las e o fiz.

Na madrugada, a chuva pela janela, imagem inesquecível. Recordo-me claramente de cada detalhe. Pela manhã, todos – menos eu – dormiam no chão da sala, palco do espetáculo ocorrido na véspera. Tudo acontecera de forma perfeitamente natural, sem nenhuma intervenção sequer. Fomos agraciados com a generosidade da natureza e a perfeição do parto natural que qualquer animal, mamífero ou não, merece.

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Parto Domiciliar – 10 perguntas para Dydy

Dielly Miranda de Souza, mais conhecida como Dydy, é Enfermeira obstetra, uma pessoa que admiro profundamente e convidei-a para falar sobre sua experiência com seus dois partos domiciliares que motivaram seu caminho dentro da obstetrícia, ajudando outras mulheres a viverem seus partos de maneira intensa, romântica e segura. (Ana Cláudia bessa)


-Como foi a decisão por seu primeiro parto domiciliar?

Tinha 21 anos e havia acabado de me formar na faculdade de enfermagem, quando engravidei. Não tinha pensando em ter um parto domiciliar, mas queria muito parir com uma colega enfermeira. Quando encontrei a Helô, ela pediu que eu pensasse sobre esta possibilidade e eu sequer hesitei “Em casa? Tá bom.”

-Mas qual seria a grande diferença entre um parto domiciliar e um parto hospitalar humanizado?

Por mais humanizado que seja um parto hospitalar, não podemos esquecer que ele acontece dentro de uma instituição e que tem rotinas a serem seguidas. Muitas maternidades que se dizem humanizadas, não são.
Existem alguns detalhes básicos para serem considerados minimamente humanizados: liberar a dieta durante o trabalho de parto; oferecer analgesia natural como bola, banho, posiçoes alternativas; abandonar a episiotomia de rotina; indução de parto, incentivar alojamento conjunto e mamada logo após o parto…
Isso tudo parece muito simples, mas poucas maternidade tem todas estas atitudes.
E mesmo nestas, há normalmente varias pessoas na sala, os partos acontecem numa mesa ginecologica, fazem aspiração de rotina no bebê, vacinam logo que nascem…
Eu queria ser dona do meu parto. Poder gritar se desse vontade (e não deu), ter pessoas da familia perto ou até mesmo ninguém, trocar carícias com meu marido e viver um evento familiar, não médico.

-Como eram as histórias de parto que voce escutava?

Eu carregava um estigma muito forte familiar, em especial de minha mãe, que sofreu demais em seus partos institucionais altamente medicalizados, cheios de intervenção, com privacidade, segurança e conforto zero.
Praticaram todas as intervençoes possiveis e imaginaveis só para ensinar aos estudantes “como fazer partos”. Soro, kristeller (empurrar a barriga), deitada, episiotomia (corte na vagina), forceps, dieta zero (incluindo sede), varios academicos na sala de parto, afastamento dos bebês por dias e quando tudo terminou, não davam nada para comer porque já era tarde. Sozinha, exausta, com fome e sem bebê. Seus dois partos foram tristes assim.
Fora isso, minha avó tinha uma historia muito legal em seus 5 partos, alguns domiciliares, e o último, uma cesárea, ficou 4 meses internada em coma por reação a anestesia.
Quando eu era adolescente, imaginava que cesárea fosse uma libertação para todo o sofrimento do parto.
Tive que descobrir por mim mesma que parto, mesmo quando dói, pode ser bom, porque traz como nada mais na vida, uma vivência que jamais tive a oportunidade de ter de outra forma.
Mas falta aos profissionais, de maneira geral, esta percepção de que o parto não é legal só fisicamente. Aliás esta a menor das vantagens. O parto aproxima mãe e filho, por causa dos hormônios liberados, e amadurece espiritualmente de uma maneira rápida e forte.

-Como foram seus partos?

O primeiro foi difícil por vários motivos. Estava num momento complicado da minha vida. Além das histórias de parto de minha mãe, vieram à tona muitas questões pessoais que prejudicaram a evolução do parto, tornando-o o mais longo da história de minha parteira.
Acredito piamente que meu emocional contribuiu de maneira negativa para meu parto, mas o parto contribuiu de maneira incisivamente positiva para minha vida.Dormi menina e acordei mulher, como costumo dizer.
Tive rachaduras muito dolorosas no seio, mas aguentei firme, porque via que, se tinha passado pelo parto, poderia aguentar qualquer coisa. E o amamentei por quase 5 anos. Isto me uniu muito ao meu filho, Klauss, hoje com quase 7 anos. Ele nasceu na água, após quase um dia de trabalho de parto e com uma circular de cordão, na presença do pai dele e de minha mãe, Helo e Marilanda, no apartamento onde morava em Macaé. O segundo aconteceu há 14 meses, após uma gravidez planejada, extremamente saudável, quando eu já cursava especializaçao em obstetricia. Hoje brinco que ela fazia partos comigo desde antes de nascer. Eu não sabia o sexo, mas acreditavamos que fosse menina e só conseguiamos escolher nomes femininos e ele veio rapido, Aglaia, uma deusa grega, bela e gloriosa. Perfeito.
Só me dei conta que estava em Trabalho de parto menos de 2 horas antes dela nascer. Liguei pra Helô e achei um exagero quando ela disse que viria. Logo a bolsa rompeu e fomos pra casa. Queria que o klauss assistisse, mas ele dormiu. Tomei banho, vomitei, bebi muita agua. A enfermeira chegou quando faltavam uns 40 minutos para o nascimento, eu estava com menos de 5 de dilatação. Meu marido dizia que iria tira-la do mesmo jeito que a havia colocado dentro de mim. Em meia hora dilatei completamente, ela me deu um copo de vinho pra relaxar e logo minha princesa veio. Meu marido a trouxe para meus braços e, como estava escuro, coloquei a mão na vagina dela “É uma menina!”
Acordamos o irmão para conhecer a ” Bochechinha”, como ele a chamava. Foi muito importante ver minhas duas, alias, três jóias ali, juntas. Sem regras, sem ninguém para criticar nada.
Fiquei muito mais ligada ao meu marido depois disso.

-Voce vai continuar fazendo partos?
Não, eu só fiz meus dois partos, os outros eu só ajudo as mulheres a fazerem o que já sabem fazer.
Me sinto cada vez mais realizada toda vez que posso ajudar uma mulher a parir sem sofrimento, sem cortes, sem imposições.
Ás vezes eu gostaria de simplesmente parar com isso, largar tudo, porque é uma carga emocional e uma pressão muito grandes. Há varias pessoas torcendo para esses partos darem errado para criticarem minha profissão e esta autonomia feminina.
Falam em escolhas na obstetricia, mas elas so valem quando é para escolher cesárea ou escolher o hospital onde parir. Acho que o direito de escolha vai muito além.

-Mas dentro desta lógica, para que servem os hospitais?

Até o inicio do último século, praticamente não existiam partos institucionais. Eram parteiras e médicos de familia. Há menos de 40 anos, o modelo atual conseguiu espaço. Em muitos lugares do mundo, inclusive do Brasil, os partos são conduzidos por parteiras, com muito sucesso. Tanto que há varias iniciativas até internacionais para valorização do trabalho e profissionalização destas mulheres, verdadeiras guerreiras, que acabam dando jeito em varias situações que, por aqui, resolvemos com cortes simples e arriscados na barriga, as vezes sem qualquer critério.
O fato é que temos hospitais e tecnologia e eles são muito bem vindos, quando necessários.
Mas o que vemos hoje é uma inversão de valores: usamos tenologias para tudo e pecamos pelo excesso e o excesso também tem consequencias. Alias, infelizmente as cesáreas, criadas para salvar cerca de 10% das parturientes com dificuldades, tem prejudicado mais do que ajudado e não sou eu que estou dizendo, mas qualquer estatística de órgaos confiáveis nacionais e internacionais, inclusive OMS.
As maternidades são necessárias para estes casos em que o parto é complicado ou mesmo impossível. Estes casos são raros, ao contrário de tantas desculpas para operar como bebê passando do tempo, cordão enrolado, “não tenho passagem”, etc.
Se as instituições fossem procuradas nos casos em que há necessidade real, evitaríamos muitas intervençoes e complicações de parto.

-A mulher pode escolher seu parto?

Esta é uma pergunta muito difícil para mim. A principio sim, desde que a mulher fosse realmente informada e bucasse por si mesma saber dos riscos de uma cesárea desnecessária.
Algumas optam por medo da dor, mas cesárea dói infinitamente mais, tanto que a anestesia é obrigatoria, fora o pós-operatorio; Quanto ás complicações, ela traz muito mais internações, infecções, necessidades de UTIs, aumento do período e gastos hospitalares e intervenções em cascata; Quanto a novas gravidezes, limita o numero de filhos, pode complicar novos partos e trazer outras morbidades; para o bebê, normalmente o distância da mãe nos primeiros instantes, pois os cuidados são maiores e mais demorados, a mãe fica sem uma posição confortável para amamentar, então o bico pode rachar mais facilmente e a criança não pode receber os primeiros cuidados por sua mãe…
Sinceramente, não vejo porquê escolher a opção que traz mais transtornos e riscos. Não compreendo como os profissionais podem aceitar esta “opção” tão facilmente, já que conhecem ainda mais de perto os perigos.
Ninguém vai ao cirurgião e diz “Quero tirar o apendice, porque já venho sentido umas dorezinhas na barriga e todo mundo na minha família tem apendicite, e como não quero sentir dor, vamos marcar a operação?”
E se alguem fizer isto, o cirurgião não aceitará. Ele fará recomendações para evitar apendicite e só operará se tiver indicação devido aos riscos de qualquer cirurgia> Por que na obstetricia deveria ser diferente?
Então vendo de uma maneira superficial, é facil ser a favor da escolha feminina, mas como escolher por um procedimento mais arriscado e que é exclusivamente médico?

-Onde as mulheres e os casais pode buscar mais informações e auxílio sobre o assunto?

Faço parte de duas ONGs que apóiam e acreditam no parto natural, constituída de mulheres de todo o país, dispostas a ajudar,de alguma forma, outras mulheres a terem direito de parirem. Da parte dos profissionais, existem eventos anualmente para o público afim e tem vários profissionais que têm esta pratica em várias partes do Brasil.
Além disso, há muitas informações na internet, inclusive científicas, como a biblioteca Cocrhaine e outros.

-Você pretender ter mais filhos?

Ser mãe foi uma experiencia tão importante em minha vida que quero ter pelo menos mais dois, além das centenas que quero ajudar a nascer como os meus: seguros e em paz.

-Para terminar, que mensagem você daria ás mulheres que desejam profundamente ter um parto natural?

Eu diria, aliás, digo: confiem em si mesmas. Não esperem milagres, façam seus partos acontecerem. Profissionais oferecem serviços e não adianta entrar numa churrascaria sendo vegetariano. Busque, se informe, não perca esta oportunidade de crecimento que é o parto. Isto não é besteira, não é um desejo pequeno. Se seu coração está pedindo, procure quem possa realmente ajudar e faça sua vida valer a pena. Não só no parto, mas onde quer que vá.

E boa hora pra você!

terça-feira, 21 de setembro de 2010

A Verdade

Aproveitando este meu momento nu e cru obstétrico, peço que você que chegou até aqui entenda que não chegou aqui por acaso e este assunto merece muito de sua atenção e reflexão.

Os riscos reais – mas principalmente – as falácias do parto normal, todos sabem de cor, mas os da cesárea, muito maiores, matem-se em segredo, pois atende aos que a praticam, sem interrupções de férias e desorganização da agenda. Esta maneira simplista de colocar a cesárea e o parto como mera questão de escolha, faz parte de um sistema capitalista que desrespeita a natureza e os que não tem voz, no caso, as crianças.

Além disso, é feita uma verdadeira sacanagem com o parto na cabeça das mulheres: de um lado, um parto longo, suado, cheio de intervenções dolorosas, sofrido, solitário, com fome, sede e grosserias. De outro, uma cesárea limpa, monitorada, rodeada de profissionais que falam manso, indolor (sob uma pancada cruel de medicamentos pesados e potencialmente alergênicos) e mais: se for particular, pode até filmar!

Ou seja, cesárea é coisa do século XXl. Coincidentemente o mesmo século das grandes guerras, da medicalização e do auge do capitalismo despretensioso e inofensivo.

E o mais triste de tudo é conversar com uma mulher, é vê-la justificando sua cirurgia com um argumento caído por terra (como cordão enrolado) e desassociando completamente a cesárea da internação na UTI Neo e do insucesso da amamentação.

Constatando, desta forma, a manipulação bem sucedida na descrença em seu corpo. Como se seu útero, pudesse ser, em alguma esfera, um lugar perigoso para seu filho.

Conseqüentemente seu leite, um alimento dispensável e ineficaz, seu carinho igualmente imperfeito. “Me dê cá seu filho que eu resolvo e você fica me devendo essa... Eternamente” diz segura a deusa Tecné.

Carregadas de propagandas negativas e preconceitos, as mulheres realmente crêem que estão preferindo uma cirurgia sem qualquer influência. E esta escolha nunca foi legitima. A cesárea e também outras intervenções desnecessárias não deveriam ser vistas como escolhas, mas como procedimentos médicos. Deveriam ser exceções.

Os países com menores índices de agravos e óbitos materno-infantis são onde mais acontecem partos naturais. Em muitos deles, a regra é o parto domiciliar com parteira. Então da onde vem esse medo brasileiro do parto? Por que sabemos tão pouco sobre nosso corpo? Por que a nossa obstetrícia intervencionista virou piada lá fora?

O bom disso tudo é que está ocorrendo uma mudança. Tivemos que chegar ao caos para fazer a revolução. E a prova dela é que você está aqui lendo esse texto enorme agora. Raciocinando e refletindo sobre algo que logo será obvio. Isso significa que quem vai fazer a mudança é você, mulher!

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Parto no Ninho - Dydy na Pais & Filhos


Depois de ter os dois filhos em casa, Dielly ficou apaixonada pelo momento do parto. Tanto que se especializou em obstetrícia, para ajudar outras mulheres a sentirem o que ela sentiu

Não foi difícil escolher o parto domiciliar. Sendo enfermeira, conheço bem o ambiente hospitalar e eu queria mais do que um parto normal convencional.

Em 2002, engravidei de meu primeiro filho. Não se falava ainda em parto domiciliar. Procurei uma enfermeira obstetra e comecei a estudar e a me apaixonar por esta possibilidade. Queria minha mãe e meu marido por perto.

Não queria cobranças, ordens ou rotinas, mas sim respeito, segurança e, principalmente, paz. Precisava da certeza de que tudo seria como desejei, a menos que fosse absolutamente necessário. E foi o que tive.

Meu primeiro filho nasceu de um trabalho de parto de quase 24h. Doeu, pensei em anestesia, cesárea, mas tinha comigo as pessoas mais importantes de minha vida por perto. O parto foi na água, e assim que meu filho saiu do meu útero, ele veio para meus braços. Nenhum cuidado rotineiro como aspiração, vacina ou mesmo banho eram mais importantes do que aquele meu momento, o primeiro instante que vi meu filho tão esperado.

Sempre tive vontade de reviver aquele sentimento e ser mãe de novo, até que...Em 2007, engravidei novamente. Foi uma gravidez saudável e não quis saber o sexo até o parto, apesar de sentir claramente que seria uma menina.

Era um domingo de dezembro, e depois de uma soneca da tarde com meu marido, acordei com cólicas. Tomei um banho morno e quis caminhar, mas as contrações não passavam. Avisei a enfermeira que faria meu parto, a Helô, só porque prometi, mas não acreditava que estivesse em trabalho de parto. Como eu não sentia dor alguma, diferente do primeiro, não quis acreditar...

A parteira pediu pra eu ficar em casa e logo senti um estalo e alguma coisa escorrer. Quando vi, estava toda molhada: a bolsa havia rompido. Foi quando comecei a sentir um pouco de dor. Colocamos as músicas do Marcus Viana que planejei para o parto e fui relaxar. A Helô chegou em casa umas 23h, minutos antes do nascimento.

Este parto foi muito intenso. Senti dor, mas foi muito rápido. Em meia hora nasceu minha menina, toda envolta em cordão umbilical e cheia de saúde. Meu marido foi a primeira pessoa a tocar nela, ele a trouxe para meus braços. Nós a beijamos e a abençoamos. Foi muito especial.

Sou apaixonada pelo momento do parto. Eu sempre digo que o parto me transformou. No primeiro, dormi menina e acordei mulher. No segundo, dormi mulher e acordei deusa. Até a dor é importante.

Mas o que difere um parto normal hospitalar de um parto domiciliar é a liberdade. Já assisti vários partos hospitalares, mas nenhum deles foi natural, a começar por serem fora de casa, fora do ninho, ao contrário de qualquer outro mamífero.

Dificilmente há alguma privacidade, habitualmente há indução com ocitocina no soro, o que torna as dores insuportáveis, sem contar os procedimentos agressivos. E o pior é que raramente esses procedimentos são necessários, em detrimento da freqüência com que são realizados.

Meus partos mexeram tanto comigo que me especializei em obstetrícia e hoje ajudo outras mulheres a sentirem tudo que senti. Talvez por gratidão ao universo, talvez por dom. O fato é que o nascimento não é um evento médico: é natural e sagrado.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Na TV!

Acesse o link e veja nossa entrevista sobre o Curso de Preparação para o Parto gratuito ministrados por mim e minha parceira teresa!

sábado, 11 de setembro de 2010

Desfazendo A Cultura para Mostrar a Verdade

Quantas e quantas vezes a vida dos humanistas se ocupam de explicar (leia-se provar) que o parto normal é bom, as indicações reais de cesárea e que ambas as “modalidades” não são uma simplista questão de escolha... Ah e que, ao contrario do que lhes fizeram acreditar a vida inteira, a cesárea da sua mãe tem tudo para ter sido, em poucas palavras, completamente desnecessária.

Eu gostaria de ter respostas simples e rápidas, pois nunca dão muito tempo para presentear com o espelho que provaria a imersão num sistema tecnocrata de tão mergulhados na cultura de incapacidade fisiológica e medo. Mas não tenho poder para te mostrar que não só a ciência está ao meu lado, mas também a lógica. Não esta “lógica” que aprendemos com a TV, mas o curso natural da vida.

Qualquer que seja o discurso, científico ou romântico, somos cortados com um “Mas então pra você não existe indicação de cesárea?” (e minha cara de paisagem).

Mais difícil é ainda falar sobre um assunto que, senão casais grávidos e alguns profissionais, ninguém além quer saber a respeito. Criticar a “forçação” do parto normal é uma regra, mas a forçação sem aspas da cesárea é inquestionável.

Falar sobre o que é óbvio é uma redundância. Mas ser redundante em nossa sociedade quando o assunto é abolição à cultura imposta é serviço para Chucks Norris da persistência... Mas vamos lá... Mais uma vez (ainda que não seja a última...):

- Não ter passagem. Uma desculpa clássica para justificar que mulheres, até mesmo sem entrarem em trabalho de parto, sejam levadas à cesariana, mais rápida e fácil para quem tem habilidade. Raramente (raramente mesmo) uma mulher não consegue se abrir para deixar passar seu filho. Isso pode (e deveria) ser identificado no pré-natal, mas infelizmente “não dá tempo” de entrar em questões tão profundas e dispendiosas emocionalmente. Algumas vezes a coisa é escrachada: 4h de “Trabalho de parto” e cesárea porque o bebê não nasceu. Noutras, uma serie de procedimentos precipitados e, tantas vezes, ultrapassados que culminam com um pesado “Você não conseguiu, eu vou conseguir por você”, digo, “Vou operar você”. Enfim, não é tão fácil assim não ter passagem de verdade.

- Cordão enrolado no pescoço. É compreensível que as pessoas achem que o cordão seja uma corda rígida capaz de fazer uma forca fatal para o bebê. Mas cerca de metade dos recém nascidos apresentam esta característica e ela raramente acarreta problemas para o nascimento. A grande maioria se desfazem com uma manobra simples (parecidíssima com a que você usa para tirar um cordão com a vantagem da lubrificação). Muitos fetos apresentam, inclusive, várias voltas ao pescoço, sem qualquer prejuízo à sua saúde. Os receios se remiriam assim a uma quantidade extremamente reduzida de cordões realmente apertados, onde há o que se fazer para que o bebê nasça um pouco mais rápido. Nunca vi, mas acredito que seja mais rara ainda a incidência de conceptos que não tenham sobrevivido. Isso não justifica expor milhares – talvez milhões – de mulheres e seus filhos a uma cirurgia eletiva com todos os riscos que lhe são peculiares.

- Passando da hora. Existem dois tipos para o rótulo “passando da hora de nascer”. O primeiro tem a ver com a longevidade da gestação, o segundo com o tempo de trabalho de parto. Por causa disso, vemos nossas amigas permitindo suas cesáreas serem marcadas com – estourando – 40 semanas ou concordando com a indicação da cirurgia após poucas horas de um duvidoso diagnóstico de trabalho de parto. Apesar dos bebês terem seu tempo, foi estabelecido um limite razoável de 42 semanas de gestação e, nestes poucos casos, o indicado é a indução (Feita corretamente, por favor). Para tranqüilidade de todos, pode-se fazer cardiotocografia a partir de 40 semanas. No caso de trabalho de parto prolongado, a avaliação fetal é O fator que deve ser levado em consideração prioritariamente e avaliar muito cuidadosamente a parada de progressão para diferenciar de progressão lenta, esta segunda mais comum. O excessivo “medo de passar da hora” não se justifica quando avaliado criticamente. Não é comum que os limites da hora do bebê sejam ultrapassados, mas na contramão, infinitas cesáreas são “justificadas” assim.

- Bebê sentado. Ou pélvico. De fato, não é um parto que os profissionais gostem de assistir. É uma distócia per se e apesar de raro a temida cabeça derradeira é um fantasma que nos assombra. Desde a faculdade, todos ouviram alguém falar que um conhecido do conhecido do conhecido pegou uma “cabeça derradeira” e fez de tudo para salvar a criança. Bom, eu também conheço um cara que passou por isso e também fiquei assustada. Em minhas “pesquisas’, conclui que o que provoca essa complicação habitualmente são exatamente o medo e a pressa compreensível por sinal. Não é tão comum bebê pélvico a termo para que se tenha larga experiência com isso. E o segredo é exatamente contrario: colocar a mulher numa posição favorável – de quatro por exemplo - e: deixar o bebê vir. Em casos extremos, instrumentos e até manobras serão necessários. O problema é que com 30 semanas já há quem esteja pensando em cesárea por apresentação pélvica ou até antes disso. É provável que o bebê vire sem intervenções, mas há quem lance mão de acupuntura, moxa, posições e exercícios, podendo até realizar a Versão cefálica externa, onde o obstetra vira o feto manualmente, com 37 semanas que – não compreendo o porquê – raríssimos obstetras sabem fazer. Há mais falácia sobre o assunto do que problemas com ele em si.

De qualquer forma, a cesariana não deveria ser vista como uma via banal de nascimento. Escolher passar por uma cirurgia não é uma escolha qualquer. Não é como optar por um estilo de roupa, nem como preferir uma pessoa à outra. E suas indicações sérias e reais não são comuns. Jamais justificariam os 90% das cesarianas realizadas nos hospitais particulares.

Descobrir a verdade sobre a obstetrícia brasileira é decepcionante e difícil.
É preciso muito mais do que confiança no profissional e um bom plano de saúde.
Cesárea não é brincadeira. Não opte sem pelo menos conhecer de fato.
Boa sorte em sua busca.

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